O CONTO DO BATELEUR:
Uma história de Tarot para crianças
Capítulo I
Era uma vez um jovem rapaz que ganhava a vida a viajar de feira em feira. Fazia truques para as pessoas, e todos riam e batiam palmas e mandavam algumas moedas. Mas um dia este jovem, cujo nome era Bateleur, decidiu que já estava farto de fazer os mesmos truques , uma e outra vez. Todas as cidades que visitava pareciam iguais. Todas as pessoas que batiam palmas, ele sentia que já as tinha visto centenas de vezes. Estava aborrecido. Então dobrou a sua mesinha. Arrumou os poucos pertences e decidiu embarcar numa longa, longa viagem. Queria descobrir o mundo! Queria aventura!
Capítulo II
Mas não sabia para onde ir. Então parou na casa de uma senhora, para lhe darem indicações. O nome da senhora era Papisa. Era uma senhora muito sábia e muitas pessoas a visitavam quando tinham perguntas. Ele implorou para que ela lhe desse algum conselho. “Não sei para onde deves ir, mas posso dizer-te como ir”, disse ela. “Deves ouvir o que o coração te diz. Se o teu coração diz para ires para a direita, vai para a direita. Se diz para ires para a esquerda, vai para a esquerda”.
Capítulos III e IV
O Bateleur decidiu ir pela direita e chegou a um castelo. Neste castelo viviam uma Imperatriz e um Imperador. A gentil Imperatriz deu-lhe pessoalmente as boas-vindas e providenciou-lhe comida e uma cama para dormir aquela noite. O Imperador era poderoso, mas justo e o seu povo adorava-o . O Imperador deu ao Bateleur permissão para viajar nas suas terras.
Capítulo V
Na manhã seguinte, o Bateleur agradeceu à Imperatriz e ao Imperador pela gentileza e continuou a sua viagem. Andou muitos quilómetros, por montes e vales e chegou a uma floresta. Mas, como por vezes acontece em florestas, perdeu-se. Começou a sentir-se assustado, sozinho e sem esperança. Gritou: “o que é que faço agora?”
Enquanto estava sentado com a cabeça entre as mãos, apareceu o Papa. O Papa era amigo da Papisa que já tinha ajudado o Bateleur no início da sua viagem. Lembram-se dela? O Papa animou o Bateleur e deu-lhe um mapa para o ajudar a sair da floresta.
“Adeus e fica bem”, disse o Papa. “Nunca te esqueças que, se tens uns mapa, não te podes perder”.
Capítulo VI
Com a ajuda do mapa, o Beteleur caminhou até ao fim da floresta e chegou a um prado, com árvores de fruto e ovelhas a pastar. Era tudo tão bonito que ele hesitou em continuar. “Talvez construa aqui uma cabana e viva aqui o resto da minha vida. Mas se ficar aqui, nunca vou saber o que está para lá do horizonte. Viajar assim pode ser tão cansativo. Mas seria uma pena eu abandonar o meu sonho”. O pobre Bateleur simplesmente não consegui decidir se havia de continuar ou não a sua viagem.
Então o Sol pôs-se. Ele nuca tinha visto uma cena igual. O céu ficou subitamente dourado, vermelho, laranja, rosa e violeta, com raios de luz azuis a espreitar por entre as nuvens de algodão. Os pássaros enchiam o ar com as suas canções de entardecer. O Bateleur estava maravilhado e sentiu tal paz e amor no coração que não hesitou mais “Se isto faz parte do mundo que estou prestes a descobrir, então a minha decisão está tomada. Vou continuar a minha viagem”.
Capítulo VII
Depois de uma boa noite de sono na relva macia, acordou com o som de rodas. Um homem passava num carro puxado por dois cavalos. “Saudações, homem”, gritou o Bateleur. “Poder vender-me o teu belo carro e os cavalos? Tenho moedas de ouro no meu saco e pago-te bem”. O homem concordou em vender-lhe os seus cavalos e o carro. Que orgulho sentia agora o Bateleur. “Isto é maravilhoso!”, gritou. “Posso fazer os meus cavalos galopar e sentir-me como um cocheiro! Vou chamar ao meu carro uma Carroça! E vai levar-me ao fim do mundo!”
Capítulo VIII
Mas o nosso amigo não estava a prestar atenção. Estava a conduzir demasiado depressa e bateu numa pedra grande na estrada. Guinou para a esquerda e o seu carro bateu contra uma cabana. A cabana ficou em pedaços, tal como a Carroça. “Oooh”, gritou uma voz zangada. “Olha o que fizeste à minha cabana!”. Uma senhora saíu por detrás de uma árvores onde tinha estado a estender a roupa. “Agora como é que vais pagar isto? Tem de ser feita Justiça!”. O pobre Bateleur não tinha dinheiro na sua bolsa – tinha gasto o dinheiro todo nos cavalos e no carro. Mas como ele era um homem honesto, e sentia-se mal por ter destruído a casa da senhora, deu-lhe os seus cavalos. E continuou a sua viagem a pé, não se sentindo muito satisfeito consigo próprio, como podem imaginar!
Capítulo VIIII
Um velho caminhava lentamente pela estrada è frente do Bateleur. Era o Eremita e era conhecido por todo o lado. Ia de vila em vila, a ensinar às pessoas como encontrar a verdade. Levava um cajado onde se apoiava. E levava uma lanterna para o guiar à noite. O Bateleur aproximou-se dele. “Bom dia, senhor”, disse ele. O Eremita olhou para ele durante muito tempo. Depois disse “Bom dia para ti, Bateleur”. “Como sabe o meu nome?” perguntou o Bateleur. “Está escrito nos teus olhos, e posso ler os teus olhos” disse o Eremita. “Sabes meu, amigo, a maioria das pessoas pensa que o tempo passa. Na verdade, ele mantém-se onde está”. E de repente desapareceu. Num minuto estava ali, noutro já não estava. O Bateleur esfregou os olhos e pensou: “Devo estar a sonhar”.
Capítulos X e XI
Tinha acontecido tanta coisa nos últimos dias! O Bateleur tinha conhecido tanta gente, visto tantas coisas novas, tinha feito tantas coisas! Estava a começar a ficar com a cabeça a andar à roda! Parecia aquelas Rodas da Fortuna que ele via nas feiras em que costumava andar. Virava-se a Roda, mas nunca se sabia o que se ia ganhar. “Hmmm”, pensou. “A vida é cheia de surpresas inesperadas. A vida exige coragem”, pensou. “Para conquistar a vida, há que ter Força”.
Capítulo XII
Então ele pensou na vida e as suas mudanças e transformações. Pensou no que tinha deixado para trás. Pensou no que tinha ganho. Pensou no que tinha perdido. Sentiu-se entre dois mundos – como se estivesse de cabeça para baixo. “Hoje estou como o Enforcado”, riu. “Pendurado aqui a pensar”.
Capítulo XIII
Como o nosso Bateleur tinha mudado. Quase que já nem se conseguia reconhecer. Ele era apenas um jovem que sabia pouco da vida no início da nossa história. Tudo o que ele sabia antes era os seus truques, as suas feiras e algumas cidades do seu condado. Tinha mudado tanto em tão pouco tempo. “Engraçado”, disse. “Sinto que já não sou realmente eu. Mas ao mesmo tempo, eu sou eu. Não consigo dar um nome a este sentimento”.
Capítulo XIIII
Ele continuou no seu caminho e chegou a uma estalagem. Em troca de alguns dos seus velhos truques para entreter os hóspedes do estalajadeiro, deram-lhe comida e guarida para a noite. E nessa noite teve um sonho. Sonhou que um anjo o visitava. “Sou o teu anjo da guarda”, disse-lhe no sonho. “O meu nome é Temperança. Sempre que precisares de mim, chama-me e eu dar-te-ei paz”.
“Que sonho bonito”, suspirou o Bateleur quando acordou.
Capítulo XV
Lavou-se e desceu até a sala para tomar o pequeno almoço. À mesa estava um homem com um ar malévolo. O homem disse: “Vi os teus truques ontem à noite. Se te juntares a mim, posso levar-te a lugares onde nos podemos tornar ricos! Vou ensinar-te alguns truques que vão fazer as pessoas querem dar-nos todo o seu dinheiro! Vou ensinar-te truques que farão teres poder sobre as pessoas! O que dizes?”
O Bateleur pensou que era bom ser rico. Mas algo naquele homem o fez lembrar o Diabo. E lembrou-se do que a Papisa lhe tinha dito há muito tempo: “Se o teu coração te diz para ires para a direita, vai para a direita. Se diz para ires para a esquerda, vai para a esquerda”. Pensou na Temperança que o tinha visitado em sonhos para falar sobre paz e soube que com este homem Diabo ele nunca encontraria paz
“Não, obrigado”, disse educadamente ao homem Diabo, e levantou-se e saiu da estalagem.
Capítulo XVI
O Bateleur não estava feliz. E já não sabia para que é que estava a caminhar. Já não sentia a excitação de viajar. Sentiu que não tinha objectivo. Disse a si próprio: “Qual é o meu lugar no mundo? Quem se preocupa comigo? Ninguém sente a minha falta. Ninguém se importa se vivo ou morro se faço truques, as pessoas batem palmas e depois esquecem-se. Ninguém precisa de mim”.
De repente sentiu que o seu passado tinha sido atirado de uma Torre alta e se tinha despedaçado em mil bocados. Caminhou solitariamente pela estrada e quando a noite caiu, sentou-se cansado debaixo de uma árvore e esperou que o sono viesse. Estava uma noite de tempestade, e a chuva batia-lhe na cara.
Capítulo XVII
Lembram-se da última vez que o Bateleur estava preocupado? Pois foi! Ele viu aquele lindo pôr do Sol. Agora a noite tinha caído e o Sol já se tinha posto. Mas antes de fechar os olhos, as nuvens abriram no céu, e abrilhar claramente estava uma Estrela. Olhou para essa Estrela e ele cintilou para ele e pareceu dizer-lhe: “Meu amigo, alegra-te. Quem sabe o que traz o amanhã?”. O Bateleur fez um sorriso, a chuva parou de cair e adormeceu a sentir-se muito mais feliz.
Capítulo XVIII
Antes da madrugada, acordou. A sua Estrela tinha desaparecido, mas a Lua estava a olhar para ele. A lua parecia tão velha, como uma mãe anciã, linda. Ele pensou: “O mundo é tão misterioso. É como a Lua. Quem é que alguma vez viu o outro lado da Lua? Há segredos a descobrir. Deixem-me continuar a minha viagem e ver o que esses segredos me podem ensinar.”
Capítulo XVIIII
Quando a manhã chegou, o Sol brilhava em toda a sua glória. Secou as roupas molhadas do Bateleur, aqueceu o seu corpo. Ele deitou-se na relva e ouviu os pássaros a cantar, as abelhas a zumbir. Viu as borboletas a voar. Viu um sapinho verde a saltitar até ao lago mais próximo. Um esquilo a subir a uma árvore.
Capítulo XX e XXI
E subitamente, como uma trombeta dos céus a chamar triunfantemente as pessoas para um julgamento final das suas vidas, o Bateleur percebeu que fazia parte do Mundo. O Mundo já não estava fora dele, mas no seu coração. Ele era o Mundo, tal como a relva, os pássaros, as abelhas, as borboletas, o sapo e o esquilo.
Epílogo
E o Bateleur sentiu-se livre. E a liberdade era boa. Ele podia ser o que quisesse. Um génio ou um Louco.
E estava satisfeito.E é o final da história. Agora fecha os olhos e dorme.
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